AGRAVO – Documento:6924514 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA AGRAVO INTERNO EM Apelação Nº 5117154-94.2024.8.24.0930/SC RELATOR: Desembargador LUIZ ZANELATO RELATÓRIO P. G. D. R. T. interpôs agravo interno contra a decisão unipessoal que não conheceu o recurso de apelação, por ausência de representação processual válida, e condenou o procurador ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, com base no art. 104, §2º, do CPC, nos seguintes termos (evento 18, DOC1): I – P. G. D. R. T. e CREFISA SA CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTOS interpuseram recursos de apelação da sentença proferida pelo Juízo da Unidade Estadual de Direito Bancário nos autos da ação revisional de juros, que julgou parcialmente procedente a pretensão do autor (evento 23, DOC1).
(TJSC; Processo nº 5117154-94.2024.8.24.0930; Recurso: AGRAVO; Relator: Desembargador LUIZ ZANELATO; Órgão julgador: ; Data do Julgamento: 13 de novembro de 2025)
Texto completo da decisão
Documento:6924514 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA
AGRAVO INTERNO EM Apelação Nº 5117154-94.2024.8.24.0930/SC
RELATOR: Desembargador LUIZ ZANELATO
RELATÓRIO
P. G. D. R. T. interpôs agravo interno contra a decisão unipessoal que não conheceu o recurso de apelação, por ausência de representação processual válida, e condenou o procurador ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, com base no art. 104, §2º, do CPC, nos seguintes termos (evento 18, DOC1):
I – P. G. D. R. T. e CREFISA SA CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTOS interpuseram recursos de apelação da sentença proferida pelo Juízo da Unidade Estadual de Direito Bancário nos autos da ação revisional de juros, que julgou parcialmente procedente a pretensão do autor (evento 23, DOC1).
Foram apresentadas contrarrazões.
Distribuído o feito a esta relatoria, constatou-se, de ofício, vício na representação processual da parte apelante, razão pela qual foi determinada sua intimação para, no prazo de 10 (dez) dias, regularizar a representação, mediante a juntada de nova procuração atualizada e específica, bem como de comprovante de residência da outorgante, sob pena de não conhecimento do recurso (evento 9, DOC1).
Em resposta, a parte agravante apresentou manifestação no evento 16, DOC1.
Retornaram os autos conclusos.
É o relatório.
II - Examinados os autos, verifica-se que o recurso não pode ser conhecido, porque ausente um dos pressuposto de constituição e de desenvolvimento válido do processo, consubstanciado na falta de capacidade processual da parte recorrente, ante a inexistência de mandato conferido a profissional da advocacia devidamente habilitado
Conforme consignado no evento 9, DOC1, a procuração acostada aos autos revela-se (i) genérica, por não conter poderes específicos para o foro e tampouco individualizar a demanda, em desconformidade com o artigo 105 do Código de Processo Civil; e (ii) reiteradamente utilizada em diversas outras ações judiciais, conforme verificado em consulta ao sistema .
Em resposta, o apelante não apresentou os documentos solicitados, limitando-se a apresentar manifestação na qual sustenta, em síntese, que está procedendo à juntada de procuração por meio de vídeo, no qual a outorgante manifesta expressamente sua vontade, autorizando os advogados a atuarem em seu nome. Argumenta que não há impedimento legal para esse formato, que é válido como prova da outorga, respeitando os princípios da instrumentalidade das formas e da economia processual, produzindo os mesmos efeitos de uma procuração física ou eletrônica (evento 16, DOC1).
Observa-se que não há qualquer impugnação específica quanto ao caráter genérico da procuração ou à sua reutilização em outras 13 demandas.
Em relação ao comprovante de residência, foi juntado "CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇO PÚBLICO DE DISTRIBUIÇAO DE ENERGIA ELÉTRICA" firmado entre a RGE Sul Distribuidora de Energia S.A e Priscila Linhares Sultau, indicada como "responsável pela unidade consumidora nº 4002254322, situada na EST MS 33, 1448 - 3 SUBDISTRITO VACAQUA - ROSARIO DO SUL, RS - CEP: 97590- 000". Na sequência, há um bilhete escrito à mão, em que Priscila Linhares Sultau afirma que o autor reside no endereço acima indicado (evento 16, DOC3).
Inicialmente, verifica-se que não há qualquer comprovação de vínculo entre Priscila Linhares Sultau e o autor, P. G. D. R. T.. Ademais, a própria declaração apresentada indica que o autor reside no Estado do Rio Grande do Sul, o que, por si só, revela a incompetência territorial deste Tribunal para processar e julgar a presente demanda.
Não fosse isso, com base no conteúdo do vídeo mencionado, verifica-se que a chamada “procuração em vídeo” consiste em uma breve declaração em que o autor diz "Meu nome é Paulo Giovanna da Rosa Torres. Meu CPF é 6724 XXX 1072. Eu permiti os processos contra a Crefisa e o Agibank e conheço todos os advogados da ação dos referentes processos".
A toda evidência, não há, nem de longe, como considerar o vídeo apresentado como instrumento de procuração válido. O conteúdo se limita a uma breve fala do autor, mencionando seu nome, CPF e afirmando genericamente que “permitiu os processos contra a Crefisa e o Agibank”, sem qualquer menção aos poderes conferidos, à identificação dos procuradores ou à outorga formal de representação processual. Trata-se de manifestação absolutamente insuficiente e incompatível com os requisitos legais.
O despacho judicial foi claro e objetivo ao determinar a juntada de nova procuração, com data atual, regularmente assinada, preferencialmente com firma reconhecida em cartório, e que contenha poderes específicos para representação no presente feito, especialmente diante da reutilização indevida da mesma procuração em 13 processos distintos.
A propósito, o artigo 105 do Código de Processo Civil estabelece que a procuração deve ser outorgada por instrumento público ou particular assinado pela parte, habilitando o advogado a praticar todos os atos do processo, exceto aqueles que exigem cláusula específica, como receber citação, confessar, reconhecer a procedência do pedido, transigir, desistir, renunciar ao direito sobre o qual se funda a ação, receber, dar quitação, firmar compromisso e assinar declaração de hipossuficiência econômica.
Além disso, o §2º do mesmo artigo exige que constem na procuração o nome do advogado, seu número de inscrição na OAB e endereço completo, requisitos absolutamente ausentes no vídeo apresentado.
Portanto, o vídeo não supre, nem minimamente, os requisitos formais exigidos pela legislação processual, sendo inadmissível sua aceitação como instrumento de mandato.
Vale destacar que, embora a Nota Técnica CIJESC nº 3/2022 tenha como objeto inicial a judicialização de demandas envolvendo contratos de empréstimo consignado, seu escopo e finalidade são mais amplos, voltando-se ao enfrentamento da chamada litigância predatória e da judicialização massiva de ações padronizadas, independentemente da natureza específica do contrato bancário discutido.
O documento alerta para práticas reiteradas de ajuizamento de ações com petições genéricas, ausência de documentos essenciais, utilização de procurações desatualizadas e padronizadas, bem como a falta de individualização da causa de pedir - condutas que comprometem a higidez da relação processual e impõem sobrecarga indevida ao sistema de justiça.
A Recomendação CNJ nº 159/2024, por sua vez, é ainda mais clara ao tratar da litigância predatória como fenômeno processual desvinculado do tipo de contrato discutido. Em seu item 1, dispõe:
"Recomendar aos tribunais que adotem medidas preventivas e corretivas diante de indícios de litigância predatória, caracterizada pelo ajuizamento massivo de ações com petições padronizadas, ausência de documentos essenciais, procurações genéricas ou desatualizadas, e ausência de vínculo efetivo entre o patrono e a parte representada.”
E no item 2, reforça:
“Os tribunais devem exigir, como condição mínima de admissibilidade da petição inicial, a apresentação de procuração específica e atualizada, bem como a individualização da causa de pedir e do pedido, de modo a permitir o exercício efetivo do contraditório e da ampla defesa.”
Essas diretrizes são aplicáveis independentemente da natureza do contrato bancário discutido, pois visam combater práticas processuais que comprometem a integridade do sistema de justiça
Destaca-se, nesse contexto, a necessidade de rigor na verificação da regularidade da representação processual, da observância à boa-fé objetiva e da cooperação entre os sujeitos processuais, princípios estruturantes do processo civil contemporâneo.
No caso concreto, estão presentes diversos elementos que evidenciam indícios de litigância predatória e justificam a adoção das medidas previstas na legislação processual:
(i) a procuração acostada aos autos é genérica, sem individualização da demanda ou poderes específicos para o foro, em afronta ao disposto no art. 105 do CPC;
(ii) há reutilização reiterada da mesma procuração em diversas outras demandas, conforme verificado em consulta ao sistema ;
(iii) a parte não atendeu à determinação judicial de regularização da representação processual, sem juntar nova procuração ou comprovante de residência atualizado;
(iv) a defesa apresentada não enfrenta os fundamentos processuais apontados, sem qualquer impugnação específica quanto à genericidade ou à reutilização do mandato.
Diante desse cenário, a aplicação da Nota Técnica CIJESC nº 3/2022 e das Recomendações do CNJ nº 127/2022, nº 129/2022 e nº 159/2024 mostra-se não apenas cabível, mas necessária, como medida de preservação da integridade do sistema de justiça, de contenção de práticas processuais abusivas e de garantia da efetividade da jurisdição.
Inclusive, o Superior , entre os dias oito de março de dois mil e vinte e três e dezoito de julho de dois mil e vinte e cinco, o advogado Cassio Augusto Ferrarini, inscrito na OAB sob o número RS095421, ajuizou um total de cinco mil trezentas e quarenta e seis ações judiciais, todas contra instituições financeiras. Esse número representa uma média de aproximadamente oito vírgula sessenta e cinco processos por dia útil, o que indica uma atuação sistemática e em larga escala.
Diante desse cenário, impõe-se rigor na verificação da regularidade da representação processual, em observância aos princípios da boa-fé objetiva, da cooperação e da segurança jurídica, que estruturam o processo civil contemporâneo.
2.2. Da Aplicabilidade da Nota Técnica CIJESC nº 3/2022 e das Recomendações do CNJ nº 127/2022, nº 129/2022 e nº 159/2024
A Nota Técnica CIJESC nº 3/2022, elaborada pelo Centro de Inteligência do As Recomendações do Conselho Nacional de Justiça reforçam esse entendimento. A Recomendação CNJ nº 159/2024, em seu item 1, orienta os tribunais a adotarem medidas preventivas e corretivas diante de indícios de litigância predatória, caracterizada pelo ajuizamento massivo de ações com petições padronizadas, ausência de documentos essenciais, procurações genéricas ou desatualizadas, e ausência de vínculo efetivo entre o patrono e a parte representada. No item 2, estabelece como condição mínima de admissibilidade da petição inicial a apresentação de procuração específica e atualizada, bem como a individualização da causa de pedir e do pedido, de modo a permitir o exercício efetivo do contraditório e da ampla defesa.
A Recomendação CNJ nº 127/2022, por sua vez, trata da necessidade de identificação de padrões de litigância predatória e da atuação coordenada entre magistrados e setores de inteligência judicial para coibir tais práticas. Já a Recomendação CNJ nº 129/2022 orienta os tribunais a adotarem medidas de gestão processual voltadas à prevenção de demandas repetitivas e à racionalização da tramitação de ações massificadas.
Tais diretrizes são aplicáveis independentemente da natureza do contrato bancário discutido, pois visam combater práticas processuais que comprometem a integridade do sistema de justiça e a efetividade da prestação jurisdicional.
O Superior TRIBUNAL DE JUSTIÇA
AGRAVO INTERNO EM Apelação Nº 5117154-94.2024.8.24.0930/SC
RELATOR: Desembargador LUIZ ZANELATO
EMENTA
AGRAVO INTERNO EM APELAÇÃO. DECISÃO MONOCRÁTICA QUE NÃO CONHECEU DO RECURSO DE APELAÇÃO.
RECURSO INTERPOSTO PELO AUTOR.
IRREGULARIDADE NA REPRESENTAÇÃO PROCESSUAL. PROCURAÇÃO GENÉRICA E REUTILIZADA EM DIVERSAS DEMANDAS. AUSÊNCIA DE PODERES ESPECÍFICOS PARA O FORO.
INTIMAÇÃO PESSOAL DO AUTOR PARA REGULARIZAR A REPRESENTAÇÃO. MANIFESTAÇÃO SEM JUNTADA DE NOVA PROCURAÇÃO OU COMPROVANTE DE RESIDÊNCIA. DESCUMPRIMENTO DA ORDEM JUDICIAL. DEFESA LIMITADA à alegação de outorga por vídeo, cujo conteúdo não atende aos requisitos legais de validade formal. Comprovante de residência em nome de terceira pessoa, sem vínculo demonstrado com o autor, indicando domicílio diverso da jurisdição competente. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO ESPECÍFICA QUANTO À GENERICIDADE E REUTILIZAÇÃO DO INSTRUMENTO DE MANDATO. NÃO COMPROVADA A AUTENTICIDADE DA RELAÇÃO JURÍDICA ENTRE OUTORGANTE E OUTORGADO.
OBSERVÂNCIA DA NOTA TÉCNICA CIJESC Nº 3/2022 E DAS RECOMENDAÇÕES DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA Nº 127/2022, Nº 129/2022 E Nº 159/2024, ALÉM DO RESP 2.021.665/MS. DIRETRIZES QUE RECOMENDAM MAIOR CONTROLE SOBRE DEMANDAS MASSIFICADAS E INSTRUMENTOS DE MANDATO GENÉRICOS. EXIGÊNCIAS FORMULADAS QUE VISAM À PROTEÇÃO DA ORDEM JURÍDICA E À PREVENÇÃO DE FRAUDES PROCESSUAIS. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DO ACESSO À JUSTIÇA NÃO CONFIGURADA.
“O JUIZ, COM BASE NO PODER GERAL DE CAUTELA, PODE EXIGIR QUE A PARTE AUTORA EMENDE A PETIÇÃO INICIAL COM APRESENTAÇÃO DE DOCUMENTOS CAPAZES DE LASTREAR MINIMAMENTE AS PRETENSÕES DEDUZIDAS EM JUÍZO, COMO PROCURAÇÃO ATUALIZADA, DECLARAÇÃO DE POBREZA E DE RESIDÊNCIA, CÓPIAS DO CONTRATO E DOS EXTRATOS BANCÁRIOS, QUANDO HOUVER INDÍCIOS DE LITIGÂNCIA PREDATÓRIA, SOB PENA DE INDEFERIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL, NOS TERMOS DO ARTIGO 330, INCISO IV, DO CPC.” (RESP 2.021.665/MS, REL. MIN. MOURA RIBEIRO, 2ª SEÇÃO, J. 02/05/2023, SOB O RITO DOS REPETITIVOS).
RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 1ª Câmara de Direito Comercial do decidiu, por unanimidade, conhecer do recurso e negar-lhe provimento, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 13 de novembro de 2025.
assinado por LUIZ ZANELATO, Desembargador Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 6924515v3 e do código CRC bf7c44de.
Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): LUIZ ZANELATO
Data e Hora: 06/11/2025, às 16:46:53
5117154-94.2024.8.24.0930 6924515 .V3
Conferência de autenticidade emitida em 16/11/2025 15:46:05.
Identificações de pessoas físicas foram ocultadas
Extrato de Ata EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL - RESOLUÇÃO CNJ 591/24 DE 06/11/2025 A 13/11/2025
Apelação Nº 5117154-94.2024.8.24.0930/SC
INCIDENTE: AGRAVO INTERNO
RELATOR: Desembargador LUIZ ZANELATO
PRESIDENTE: Desembargador MARIANO DO NASCIMENTO
PROCURADOR(A): CARLOS ALBERTO DE CARVALHO ROSA
Certifico que este processo foi incluído como item 97 na Pauta da Sessão Virtual - Resolução CNJ 591/24, disponibilizada no DJEN de 20/10/2025, e julgado na sessão iniciada em 06/11/2025 às 00:00 e encerrada em 06/11/2025 às 15:49.
Certifico que a 1ª Câmara de Direito Comercial, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 1ª CÂMARA DE DIREITO COMERCIAL DECIDIU, POR UNANIMIDADE, CONHECER DO RECURSO E NEGAR-LHE PROVIMENTO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador LUIZ ZANELATO
Votante: Desembargador LUIZ ZANELATO
Votante: Desembargador JOSÉ MAURÍCIO LISBOA
Votante: Desembargador MARIANO DO NASCIMENTO
PRISCILA DA ROCHA
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 16/11/2025 15:46:05.
Identificações de pessoas físicas foram ocultadas